Ana Patrícia Rosa, Andreia Fernandes e Margarida Saavedra são três médicas que integraram o Projeto de Voluntariado Médico «Cuidar em Timor», de promoção do enriquecimento técnico e humano, na paróquia confiada ao cuidado dos Franciscanos Capuchinhos.

Ana Patrícia Rosa, Andreia Fernandes e Margarida Saavedra

«A vontade de partir em missão existia em nós, bem pequenina, como a chama de uma vela que foi crescendo, foi queimando as raízes que nos amarravam ao chão e iluminando o Caminho que sentíamos que tínhamos que seguir.

O Caminho tinha um destino: Timor-Leste.

Laleia foi o local escolhido, aldeia situada a cerca de 3 horas da capital Dili, no distrito de Manatuto. Carinhosamente escolhida, pelo contacto prévio com o povo de Laleia de uma de nós e através da partilha da missão ao longo dos anos entre a Fraternidade dos Capuchinhos em Laleia, Timor Leste e Barcelos, Portugal.

Somos 3 médicas, na fase do internato médico, que sonhavam em atuar num contexto social, económico e cultural diferente do nosso e, ao mesmo tempo, experimentar as dificuldades de exercer medicina em áreas carenciadas. No entanto, moveu-nos também o espírito de missão, de entrega, de ajuda e de procura que nos caracteriza. Pedimos suspensão do nosso internato médico, uma licença sem vencimento por 3 meses e no dia 4 de julho partimos para Timor.

Partimos com o mote do Papa Francisco, a propósito do dia mundial das missões de 2016: “todos somos convidados a «sair», como discípulos missionários, pondo cada um a render os seus talentos, a sua criatividade, a sua sabedoria e experiência para levar a mensagem da ternura e compaixão de Deus à família humana inteira.” Era esse o nosso objetivo, pôr ao serviço dos outros os nossos “talentos”. Pois se somos médicas, que o fôssemos numa terra onde as condições de saúde são precárias e não garantem que um bebé chegue a criança, uma criança a jovem, um jovem a adulto e muito menos um adulto a idoso.

Este sonho só foi possível porque os Frades Menores Capuchinhos, na pessoa do pároco, frei Hermano Filipe, mostraram-se prontamente disponíveis para nos acolher na Paróquia de Nossa Sra do Rosário de Laleia. Desde sempre que o povo de Laleia respeita e acolhe com muito carinho todos os missionários que chegam a Laleia e ao longo dos últimos anos têm sido alguns. Durante a  preparação do projeto contámos com o apoio de quem lá estava e nos podia ajudar a planear e o que precisávamos de angariar. E foram muitos que nos ajudaram a preparar esta missão dando o seu contributo através de nós.

Mas cedo percebemos que este caminho era muito mais do que fazer Medicina na terra do sol nascente. Este Caminho era ser, era estar para os outros, era deixar que Deus fizesse da nossa mente, das nossas mãos e dos nossos corações, instrumentos da Sua vontade. Afinal, como disse o Papa Francisco: “Quando os discípulos de Jesus percorrem as estradas do mundo, é-lhes pedido aquele amor sem medida que tende a aplicar a todos a mesma medida do Senhor; anunciamos o dom mais belo e maior que Ele nos ofereceu: a sua vida e o seu amor.” Era essa a nossa verdadeira missão e foi o que tentamos fazer todos os dias.

O Caminho levou-nos certo dia a Díli com a querida Joana que tinha um tumor no lábio inferior e que, na Clínica do Bairo Pité, foi extraído em condições de segurança que não reuníamos em Laleia. O Caminho levou na verdade um novo sorriso, uma nova confiança e alegria à Joana.

Levou-nos também a casa da Juvenita, jovem mãe de 10 filhos, agudamente doente por uma infeção que lhe tirava as forças e a capacidade de tomar conta dos seus filhos. Levou-nos a cuidar da Juvenita, quando não tinha mais ninguém que o fizesse.

Levou-nos a casa do António, que padece de défice cognitivo, com uma úlcera no pé há semanas, cada vez mais debilitado e sem apoiar o pé no chão, que apenas nos deixava fazer os pensos porque lhe levávamos um sumo de banana (truque que a irmã Albina nos ensinou). A alegria que foi voltar a ver o António a passear pela aldeia e a recuperação total da sua ferida.

Levou-nos ainda até casa do avô João, que padecendo de um tumor na face que lhe condicionava dor, estava cada vez mais confinado a casa e limitado pela incapacidade de se alimentar. Foi o Caminho que nos guiou no seu tratamento e que permitiu que o avô João voltasse à sua horta.

Levou-nos também a acompanhar a dor de uma mãe que perdeu o filho João de 16 anos. Levou-nos aí a confrontar as nossas próprias limitações humanas. Levou-nos a casa dos vários recém-nascidos que visitámos, cujas mães aconselhamos e apoiamos. Levou-nos a conhecer a Luzia, acabada de ter a Jesuína, a viverem num barraco completamente isolado da população e a lutar pela sua segurança. Levou-nos a insistir para que a Racha voltasse a frequentar a escola.

E sentimos sempre que de cada vez que o Caminho nos levava a algum lado, era a nós que chegávamos, mais ricas de cada vez, mais cheias de amor, mais cheias de gratidão por estarmos ali. A realização dos nossos dias dependia do que conseguíamos dar e ser pelo outro, por isso é que a missão é tão especial.

Andreia Fernandes , Margarida Saavedra, Ana Patrícia Rosa

Descrever a nossa vivência em Laleia, muito que recebemos teve como ponto de partida a Fraternidade. Desde a aprendizagem da língua, como conhecer hábitos e costumes dos timorenses, partilha de experiências, vidas entre povos, diferentes idades, diferentes raças, diferentes vocações, foi uma bênção.

Como nos disse o frei Manuel na nossa última refeição juntos em Laleia, “nós nunca fomos convidados, nem hoje será uma despedida, porque somos uma família e enquanto vivemos juntos, fomos sempre uma família que se reunia à volta da mesma mesa, partilhávamos as refeições, rezávamos juntos e partilhávamos a alegria de estarmos juntos”.

Estamos eternamente gratas pela missão e por tudo o que fizeram por nós. Regressamos há sensivelmente 3 semanas, mas uma parte de nós, sempre pertencerá a Laleia. Com a certeza de que a missão continua nas nossas vidas.»

Ana Patrícia Rosa, Andreia Fernandes e Margarida Saavedra

 

O mês outubro missionário tem origem no Dia Mundial das Missões, que se celebra este domingo, dia 22, e a data foi instituída pelo Papa Pio XI em 1926, como um “dia de oração e ofertas em favor da evangelização dos povos”

O Papa Francisco na mensagem Dia Mundial das Missões 2017 escreve que “Os jovens, esperança da missão”:

  1. «Os jovens são a esperança da missão. A pessoa de Jesus e a Boa Nova proclamada por Ele continuam a fascinar muitos jovens. Estes buscam percursos onde possam concretizar a coragem e os ímpetos do coração ao serviço da humanidade. «São muitos os jovens que se solidarizam contra os males do mundo, aderindo a várias formas de militância e voluntariado. (…) Como é bom que os jovens sejam “caminheiros da fé”, felizes por levarem Jesus Cristo a cada esquina, a cada praça, a cada canto da terra!» (Ibid., 106). A próxima Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que terá lugar em 2018 sobre o tema «Os jovens, a fé e o discernimento vocacional», revela-se uma ocasião providencial para envolver os jovens na responsabilidade missionária comum, que precisa da sua rica imaginação e criatividade.»
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