Os desabafos de Suheila, uma cristã idosa em Ankawa

Desde Junho que Suheila está em fuga. Primeiro, foi obrigada a deixar a sua casa, em Mossul. Depois, teve de fugir do campo de refugiados de Qaraqosh, ocupados ambos pelos jihadistas do “Estado Islâmico”. Agora vive num contentor, transformado em casa, em Ankawa.

“Estamos vivos”, diz Suheila, ao recordar os dias de medo que viveu no ano passado, quando os jihadistas do “Estado Islâmico” irromperam pela cidade de Mossul, onde vivia, e obrigaram os cristãos a fugir levando consigo apenas a roupa que traziam vestida. “Primeiro, dirigimo-nos para Qaraqosh. Porém, quando eles avançaram para lá, em Agosto, vimo-nos obrigados a fugir de novo. Agora estamos aqui, em Ankawa desde há quatro meses.

Porém, ninguém está zangado com Deus”, diz, esboçando um sorriso. “Afinal de contas, estamos todos vivos!” Suheila vive agora num contentor transformado em casa, oferecido pela Fundação AIS aos refugiados. Suheila e mais duas centenas de famílias estão agora numa cidade improvisada em Ankawa. “De facto, é uma grande melhoria para nós”, explica Suheila. Estou muito agradecida. No entanto, isto não é vida. Perdemos tudo e o pior é que não sabemos quando regressaremos à nossa terra, se é que regressaremos alguma vez.”

Ali perto fica um outro campo de refugiados. Chama-se Mar Elia de Ankawa. Aqui há apenas tendas. São sessenta tendas e 800 cristãos. “Quando chegaram, vinham todos muito traumatizados”, recorda o Padre Daniel, da Igreja Caldeia. As crianças ficaram muito afectadas. “Viam as mães em lágrimas, os pais aos gritos. Era preciso começar a reestruturar as suas vidas”, diz este sacerdote que já não esquece o olhar apático, vazio, de tantos adultos depois da revolta dos primeiros dias, quando começaram a compreender que nunca mais iriam regressar a casa.

Recomeçar

Depois dos primeiros contentores, a Fundação AIS está agora empenhada na construção de escolas. A primeira abriu as suas portas em Dezembro, em Ankawa. Estão projectadas mais sete. Por estes dias calcula-se que cerca de 7 mil crianças poderão começar a regressar à escola. Há um ano, apenas, Suheila nunca iria imaginar que agora estaria a viver num contentor em Ankawa. Há um ano, apenas, Suheila olhava à sua volta e sentir-se-ia feliz. Possuía uma casa, tinha vizinhos, rotinas. Hoje, olha à sua volta e só consegue ver homens, mulheres e crianças tristes, que choram a vida que perderam, que têm cicatrizes abertas pelos dias de susto em que foram forçados a fugir, em que foram escorraçados apenas por serem cristãos. Porém, garante Suheila, “por aqui, ninguém está zangado com Deus”. Mesmo entre tendas, mesmo entre contentores, os cristãos que vivem em Ankawa agradecem “do fundo do coração” a ajuda dos benfeitores da Fundação AIS e são, para todos nós, um exemplo extraordinário de fé viva.

Paulo Aido | www.fundacao-ais.pt

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