O nosso país tem um rico e vastíssimo património religioso, que património sustenta, em larga medida, as atividades do turismo religioso, nas quais todos nos podemos incorporar em períodos de tempo livre e de lazer, em particular nas férias.

As igrejas católicas falam de nós, falam de história, de arte, de cultura, de política, de teologia. São testemunhos de uma fé vivida em contextos muito concretos.

Desde o início do Cristianismo, em diversos períodos e ambientes geográficos e culturais, encontraram-se soluções tidas como adequadas para traduzir arquitetonicamente a ideia de Igreja. A passagem da dimensão familiar e doméstica à multidão de fiéis, por exemplo, faz crescer o espaço dedicado à assembleia.

O caráter da Igreja sempre justificou o natural desejo de que, pela especial dignidade e beleza, se distinguisse dos edifícios comuns, assumindo uma carga simbólica que não pode dispensar a participação das artes, desde a arquitetura até às chamadas artes decorativas (ourivesaria, cerâmica, marcenaria, têxteis, etc.), passando pelas artes visuais da pintura e da escultura e pela própria música. As diferentes épocas e culturas foram determinando a expressão, o estilo, as formas e até mesmo a codificação de regras ou normas a respeitar. É assim que, em grande parte, a história da arte e a história da Igreja foram caminhando lado a lado e interagindo.

Sendo lugar de celebração comunitária e festiva, uma igreja é igualmente lugar de silêncio, recolhimento, meditação e oração – dimensões a ter em conta por aqueles que ali se encontrarem.

Ler a igreja a partir do culto

Uma definição muito concisa é a que nos dá o Código de Direito Canónico de 1983: “pelo nome de igreja entende-se o edifício sagrado destinado ao culto divino” (Cân. 1214)

A relação do espaço de reunião dos cristãos com as celebrações cultuais, aqui demonstrada, é um dado da maior importância e marca a nossa conceção de templo, o qual instintivamente ligamos a um carácter sacro, especial, de “reserva”.

As realidades fundamentais que originam a convocação (de onde deriva o nome Igreja) e a celebração estão aqui em destaque: a palavra de Deus, a Eucaristia, o memorial do sacrifício de Jesus, a assembleia: uma igreja não é só uma questão de espaços, mas também uma questão de fé, de cultura e de história.

É a Liturgia, com os seus propósitos e as suas necessidades específicas, que dá o mote para a mudança na disposição interna das igrejas antigas e nas novas construções, pois os diversos sectores do culto surgem renovados e com exigências próprias em relação ao lugar do batismo, ao lugar maior da Eucaristia, à forma envolvente e unificada da assembleia.

O altar, o lugar da palavra, o batistério, as zonas de transição, os espaços para o diálogo fazem-nos perceber como o edifício-igreja é um espaço que ordena e unifica organicamente diversas zonas funcionais, articuladas segundo a sua importância.

Na reforma promovida após o Concílio Vaticano II (1962-1965), deixa de haver celebrações em altares laterias e o altar é reforçado na sua função de sinal de Cristo, mais do que objeto meramente útil. É mesa à volta da qual Cristo quis comer a Páscoa. Ocupa portanto lugar focal, convergente, irradiante.

Os percursos pela cidade podem levar-nos a estar frente a frente com uma igreja moderna, à qual não seríamos tentados a dar grande atenção. A verdade, porém, é que esses edifícios estão cheios de horas e horas de vida da comunidade cristã que os construiu e habita.

Os espaços interiores são marcados por estes dinamismos relacionais, verticais (para Deus) e horizontais (para o outro), incarnando as expressões da fé cristã e as tentativas de a viver nos nossos dias. Para acolher estes simbolismos, há que compreendê-los. Vale a pena parar, olhar e deixar-se surpreender pela mensagem escrita nestas paredes. Por dentro, em silêncio, e não apenas admirando o edifício desde o exterior.

Octávio Carmo, Chefe de redação na Agência Ecclesia, in Guia de Boas Práticas de Interpretação do Património Religioso

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