«A fuga mundi, fuga do mundo, era uma das ideias do monaquismo cristão no seu início. Talvez os monges medievais não estivessem tão longe da busca contemporânea de lugares de tranquilidade, lugares mágicosde reencontro consigo mesmo» Passamos a apresentar, na newsletter Altos  Voos, excertos do livro “Lugares do infinito – um guia de mosteiros e conventos para reencontrar o mundo”, de António Marujo e fotografia de Daniel Rocha, das Edições Paulinas. Nesta edição abrimos o apetite por estes lugares mágicos com passagens do capítulo dedicado ao Mosteiro de Santa Escolástica em Roriz.

RORIZ – Para quem tenha o incipiente desejo de rezar

Às vezes, aparece gente no limite do stress e da fadiga. «Na nossa sociedade, não se permite que a pessoa pare. E tudo está montado para que não haja verdadeiro tempo livre, que sirva para parar e pensar.» Palavra de monja, dita em tempos de supressão de feriados e em que tudo à volta nos faz sentir que a vida se deve resumir a trabalhar e a preencher os parcos tempos livres com novas animações.

A irmã Maria do Carmo Tovar, superiora do Mosteiro de Santa Escolástica, em Roriz (Santo Tirso), acrescenta: «Há pessoas que andam à busca de qualquer coisa, por vezes têm um desejo de rezar mais ou menos incipiente.» Podemos definir assim o objectivo das Monjas Beneditinas da Rainha dos Apóstolos. À volta, a quinta convida a essa verdadeira ruptura que é ser capaz de dedicar tempo ao tempo. Situadonum vale verde, de quintas e terras agrícolas, o mosteiro está rodeado de árvores de fruto. Plantações de vinha e milho, uma horta e um jardim (onde abundam as camélias, por exemplo) completam-se para dar ao ambiente uma sinfonia de cores que muda com as estações. No Outono, a música atinge o seu esplendor, com a mescla das cores fortes dos vermelhos, amarelos e castanhos e as diversas tonalidades de verde. Para a contemplação, há também o terraço da hospedaria, onde se pode usufruir de um «silêncio especial» — aquele que vem da brisa, dos pássaros ou dos cães, da passagem de automóveis ao longe… Ou ainda a «casa do caseiro», mais retirada do mosteiro, ainda que mais próxima da aldeia. Na oração, o gratuito volta a estar no centro: «É pela graça que fostes salvos, por meio da fé; não se deve às obras», diz o texto da carta de São Paulo aos Efésios (2,8-9), lido na oração de hora intermédia desta sexta-feira. A oração marca o ritmo do dia: desde logo, com momentos para a prece particular (às 7h e às 18h); depois, com os tempos comunitários, centro da vida monástica: às 7h30, laudes (louvor da manhã) e missa; às 12h30, a hora intermédia; às 17h30, vésperas; às 18h30, ofício de leitura e, às 21h, completas. Às 9h também há lectio  divina  (oração  de  base bíblica). Normalmente  é  individual,  mas,  em  determinados tempos litúrgicos como o Natal ou a Páscoa, pode ser partilhada entre as irmãs e os hóspedes. Estes são convidados a participar em todos os tempos de oração que desejem — a capela está aberta a todos, pois as irmãs consideram que a sua oração é também oração da comunidade dos crentes. (…) Como em qualquer espaço beneditino, o lema é ora et labora, reza e trabalha. Na Regra de São Bento, lê-se: «São verdadeiros monges se vivem do trabalho de suas mãos.» Para cumprir com a sua vocação, as
monjas do Mosteiro de Santa Escolástica fazem trabalhos de paramentaria e confeccionam compotas e umas deliciosas bolachas de manteiga com a marca do mosteiro — nestes casos, com a colaboração de várias funcionárias (caixas de meio quilo custam 7,25€, as de quilo 13,30; sacos de meio quilo, que podem não incluir todas as variedades, ficam em 4,25€). Hóspede ou não, pode passar-se pelo mosteiro e comprar estas delícias. Mas, a partir de Novembro, só por encomenda, que as mãos já não chegam para tantos pedidos. Regressamos à capela, onde se prova outra doçura – abusando de Miguel Torga, uma doçura «que se não prova», mas «se transfigura/ Numa doçura/ Muito mais pura/ /E muito mais nova», como escrevia o poeta em Confiança. Com vozes que parecem um sussurro, as monjas rezam o Salmo 118: «Como poderá um jovem manter puro o seu caminho? Só guardando as tuas palavras. Eu procuro-te com todo o coração. Não deixes que me afaste dos teus mandamentos. (…) Alegro-me mais em seguir as tuas ordens do que em possuir qualquer riqueza.» A respiração comanda o ritmo da oração, o ritmo é pausado, brota um incipiente desejo. Por instantes, o mundo está em harmonia. CONTACTOS Mosteiro de Santa Escolástica Rua do Mosteiro, 2 4795-311 Roriz – Santo Tirso Tel.:252 941 232 E-mail: monjas.beneditinas@clix.pt

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