É o mais novo país do mundo mas tem já todos os defeitos da humanidade. A festa da independência, em Julho de 2011, durou pouco. Menos de dois anos depois, o Sudão do Sul iniciou uma guerra consigo mesmo. É a pior das guerras, quando o inimigo está dentro de portas, fala a mesma língua, vive na mesma cidade, às vezes pertence, até, à mesma família. 

Fevereiro. Homens armados invadem uma aldeia e fazem buscas casa a casa. Levam 89 rapazes. Sequestrados, vão engrossar um dos muitos grupos armados que pululam no país. Quase todas estas crianças tinham pouco mais de 12 anos. Só no ano passado, mais de 12 mil crianças serviram os senhores desta guerra.

Desde Dezembro de 2013 que o Sudão do Sul está dividido entre partidários do presidente e do ex-vice-presidente. Entre os que seguem Salva Kiir e Riek Machar há mais ódio do que ideologia. Kiir pertence à etnia Dinka. Machar é da etnia Nuer. A guerra civil já provocou dezenas de milhares de mortos e quase 1 milhão de refugiados. Há casos de pessoas mortas em Igrejas e mesquitas. Ninguém está a salvo em lugar algum. Os números são assustadores. Segundo a ONU, quase três milhões de pessoas precisam de ajuda alimentar. O número cresce, quase para 7 milhões, se juntarmos à fome as doenças.

“Rezem por nós”

Em Julho do ano passado, num par de dias, tudo se transformou. As cidades de Bentiu, Malakal e Bor ficaram irreconhecíveis. 30 mil casas em ruína e mais de 100 mil pessoas em fuga. Oito meses depois, as cicatrizes da violência continuam à vista de todos, como ferida que não cicatriza. “Os ataques foram brutais. Muitas das nossas igrejas e casas foram destruídas e tudo o que tínhamos foi saqueado. Estamos num estado miserável”, reconhece Monsenhor Roko Taban. Dirigindo-se aos benfeitores da Fundação AIS, o bispo de Malakal deixa um apelo: “Por favor, lembrem-se de nós nas vossas orações!” 

As crianças são o elo fraco nesta tragédia que o mundo parece ignorar. São arrancadas à família e mobilizadas à força. Sem escrúpulos, dão-lhes um uniforme e uma arma. Ensinam-lhes a despejar as balas dos carregadores e enviam-nas para o mato, para as frentes da guerra, para o abismo. Muitas, morrem. Mesmo as que sobrevivem às balas, morrem de alguma maneira. Perdem a inocência para sempre. Algumas, nunca mais são vistas. Esta é uma terra de ninguém. Às vezes, é possível resgatar alguns destes rapazes. Mas é uma tarefa difícil. É preciso sempre muito tempo e amor para tirar a guerra de dentro destas crianças-soldado. Às vezes é impossível.

por Paulo Aido |  www.fundacao-ais.pt  

(Fotografias fornecidas pela Fundação AIS)

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