O mundo seria muito mais pobre sem o voluntariado. Ser voluntário começou sempre ao meu lado, bem perto do dia a dia. Só mais tarde decidi voar mais alto e abraçar outras causas. Esqueci todos os perigos, esqueci todos os riscos. Parti!
A Roménia, foi o primeiro voo. Seis meses a trabalhar com crianças de rua, cerca de 1200 em Bucareste. O trabalho duro, mas desafiante. Por uma vida salva, valeu a pena. Estar ali porque queria, vivendo de uma forma simples, em comunidade, partilhando tudo. Aproximando-me dos que sofrem.
Sem poder parar…e porque o voluntariado é um bichinho que nos habita e nunca se cala, segui viagem.
O voo seguinte, Turquia. Seis meses num hospital, oncologia pediátrica. Cinquenta crianças com leucemia, para amar, confortar, animar e ensinar. Famílias inteiras para fazer sorrir. Eu era um palhaço azul, que rompia pelos corredores, pelos quartos, espalhando cor…mesmo sabendo que muitos iam perder a vida, estava ali porque queria, porque fazia sentido, iluminar essa réstia de vida de alguns, ou colorir a luta de outros tantos. Um dia de cada vez. Muitos sucessos, alguns retrocessos, mas sorrir, fundamental.
Mais um voo, desta vez, mais alto. Moçambique, um ano e meio.
Pelas minhas mãos, passaram 90 crianças em sala, mais as que vinham fora do contexto escolar. Vi-as evoluir e aprender a ler e a escrever corretamente, vi-as desabrochar em afetos e regras que desconheciam. Partilhamos tudo, juntos, como se de um mesmo barco se tratasse.
Depois, recordo, o receber aquele sol na pele, nunca vou deixar de sentir aquele ar puro e um cheiro único, uma terra vermelha…que me pinta por completo o coração.
Nunca vou deixar de ouvir os gritos dos meus meninos a brincar ou a chamar por mim, logo pela manhã. Nunca vou esquecer, como era bom comtemplar um céu estrelado, nunca vou deixar de sentir a imensidão de uma terra que parece não ter fim.
Em todos os locais, por onde passei como voluntária, o mais belo, eram as pessoas e os afetos trocados. Eu sentia que aquele era o meu dia-a-dia, a minha rotina, os meus afazeres que cumpria com um agrado, que me tornava a mim e aos outros, em pessoas felizes e cheias de esperança na vida e no futuro. Não era um trabalho, um esforço, uma obrigação, era a minha vida!
E eles, como me fizeram descobrir capacidades que desconhecia em mim, ou aprofundar aquelas que já me caracterizavam. Foi dos momentos mais fortes da minha vida. Agora sei, que a mudança em mim, essa foi enorme…
E devo-a a cada pessoa, com quem me cruzei. Voluntária, serei sempre, onde e com quem estiver.
A vida vai avançando…e as pessoas mudam de lugar, mudam de rumo… mas acredito que nelas fica sempre o que deixamos de bom. Do gesto mais simples, como o sorriso, ao gesto mais profundo, como mudar uma vida.
A verdade reside no que é simples. Onde não existe quase nada. E todos nós temos algo capaz de preencher o nada de alguém.
Então escolherei este lado da vida…sempre.
A verdade simples ficou naquilo que se deu, longe.
Tudo, tudo impresso neste coração, para a vida.
Rita Ramalho, voluntária